Listen and read

Step into an infinite world of stories

  • Read and listen as much as you want
  • Over 1 million titles
  • Exclusive titles + Storytel Originals
  • 7 days free trial, then €9.99/month
  • Easy to cancel anytime
Subscribe Now
Details page - Device banner - 894x1036

Pés descalços na pedra quente

Language
Portuguese
Format
Category

Fiction

Amarildo Veiga é poeta, um desses que lavram o cotidiano à procura de alguma coisa indescritível e luminosa. Pés descalços na pedra quente é poesia em estado natural. Como em tudo neste mundo da propriedade privada, cercaram a poesia com arame farpado e declararam-se donos do campinho. Quem fez isso? Autodenominados críticos literários, especialistas, poetas modernos, etc. Onde cresce a modernidade, essa erva daninha alucinógena, crescem também as cercas do pretenso bom gosto. A modernidade é o antropocêntrico narcísico, o progresso e a certeza do futuro redentor. No Brasil, a poesia só ganha certidão de existência se tiver humor, humorzinho, uma sacadinha na última hora, no êxtase. Ela foi tão constrangida que não vai além do sussurro, tão coloquial que não passa de prosa sem ir até o final da linha, tipo "meu pai foi ao cinema/eu não fui". E daí? Esse "e daí?" seria a poesia. O efeito poético. Amarildo anda no encalço da vida: "teu riso ao contrário/a derramar nos paralelepípedos". A vida, porém, é uma desvairada que se esconde no desvão das escadas, no meio da multidão que dobra as esquinas sem saber para onde vai, enfim, nas dobras do mundo, que são tantas a ponto de não caber em GPS. Poesia é algo que não se mensura, em que não se coloca tornozeleira eletrônica, que não se prende pela palavra certa, palavra empenhada, palavra escandida, essas coisas que faz todo poeta quando perde o sono e não tem Rivotril em casa para as emergências noturnas e os acertos de contas com a dor dos milênios. "Nos signos inseridos nos portais da antiga cidade/o que mais reverbera é o teu nome", escreve o poeta Amarildo. Todo nome cabe nessa reverberação, inclusive o da poesia. Afinal, poeta é quem desafia o regime das contas, o sistema das normas, a hierarquia estética, a cor das sílabas, a alquimia dos versos. Poeta é quem larga tudo e vai traficar palavras. A pena do poeta é não ter embargos declaratórios nem infringentes. Só lhe resta, como Amarildo Veiga, anunciar: "Minha arma minha vida/A morte é tua". Morre a poesia quando alguém a coloca no livro de honra da arte.

© 2024 Editora Sulina (Ebook): 9786557592014

Release date

Ebook: December 9, 2024

Others also enjoyed ...

This is why you’ll love Storytel

  • Listen and read without limits

  • 800 000+ stories in 40 languages

  • Kids Mode (child-safe environment)

  • Cancel anytime

Unlimited stories, anytime

Unlimited

Listen and read as much as you want

9.99 € /month
  • 1 account

  • Unlimited Access

  • Offline Mode

  • Kids Mode

  • Cancel anytime

Try now